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20 de maio de 2015

Doutor Garcia - 1932 * 2015

Interessante como não conhecemos de verdade algumas das pessoas com as quais convivemos. Quando nossa cidade era realmente pequena, nos anos 1960/70, eu pensava que conhecia todos os moradores locais. Se fosse um médico então, ele praticamente era um membro da família. Bastava uma única consulta para tanto.

Lendo o site Boca Santa, do jornalista Sid Sauer, fiquei sabendo da morte do doutor Garcia, um dos fundadores do hospital Policlínica de Campo Mourão. Lembrava bem dele e sabia dessa ligação com o hospital mourãoense, mas não sabia de muitos detalhes de sua vida que foram registrados num obituário da Gazeta do Povo. Não sabia que era nascido no Paraguai e nem lembrava que tinha sido vereador por aqui, por exemplo.     

Leiam abaixo a matéria da Gazeta do Povo e vejam que bela história construiu o pioneiro mourãoense:


Jorge Elizardo Garcia Árias: meio século dedicado à medicina

A força de vontade e o espírito pioneiro do médico Jorge Elizardo Garcia Árias possibilitaram a abertura da Policlínica de Campo Mourão, no Centro-Oeste do Paraná, em 1960. Ele atuou como médico e administrador, até a década de 1980, no espaço que foi considerado o primeiro grande hospital da região. Desde menino sonhava em ser médico. Em 57 anos de dedicação à medicina, o doutor Garcia, como era conhecido, era famoso por honrar seu juramento a Hipócrates.

Nunca negou atendimento para os que não podiam pagar por uma consulta ou tratamento, lembram-se os filhos. As 24 horas eram repletas de atendimentos, partos e cirurgias. Era um médico generalista. Doutor Garcia também se deslocava para as cidades vizinhas quando surgia uma emergência. Não importava a hora e o dia da semana. Muitas foram as vezes que o telefone tocou ou o chamaram no portão de casa durante a madrugada ou nos fins de semana.

O filho Marcelo conta que certa vez o pai tratou de um paciente que precisava de transfusão de sangue imediata. Como o tipo sanguíneo não estava disponível e era o mesmo de Garcia, o médico não pensou duas vezes diante da gravidade do caso e fez a coleta do seu próprio sangue para realizar a cirurgia de emergência. O importante era salvar o paciente.

Nascido no distrito de Villarrica, no Paraguai, em 1932, ficou órfão de pai durante a Guerra do Chaco, conflito armado entre Paraguai e Bolívia. O pai era professor e entregou a vida em favor do seu país. O conflito se estendeu até 1935. Ao saber a guerra deixou muitas crianças sem os pais, Manoel Ribas, que era governador do Paraná, selecionou os alunos com as melhores notas em cada província do Paraguai e deu bolsa de estudo no antigo Colégio Partenon, em Curitiba.

Garcia foi selecionado e chegou a capital paranaense aos 9 anos. Deixou a mãe e uma irmã no país vizinho. Tornou-se aluno interno do ginásio e realizou o Científico –que se assemelha ao Ensino Médio – no Colégio Estadual do Paraná. Mesmo com a distância da terra natal e as saudades da família, o menino, que sonhava cursar Medicina para ajudar os mais necessitados, não esmoreceu.

Com dedicação, foi aprovado no primeiro vestibular que prestou para a Universidade Federal do Paraná (UFPR), na década de 1950. Entre aulas e plantões, atuou como professor em um cursinho pré-vestibular. Ele incentivava os estudantes de origem humilde, assim com ele, a se concentrarem nos estudos e prosperar. Deu certo.

Era um período fértil de novas ideias e pensamentos, fez amizade com imigrantes de diversas origens, assim como jornalistas, advogados, políticos e empresários. Tornou-se colaborador do jornal O Estado do Paraná, e defendia causas sociais e econômicas do Paraná. Sua atuação foi reconhecida pelo Clube Curitibano, que acolheu o paraguaio naturalizado brasileiro como um dos seus membros.

Durante a graduação, Garcia namorou uma das filhas de um imigrante alemão. A moça estudava Odontologia na UFPR. Após a formatura, em 1958, eles se casaram e foram morar em Campo Mourão, onde ele abriu um consultório médico. Eles se separaram em 1976. Para se aperfeiçoar, Garcia fez residência na Santa Casa de Misericórdia de Santos (SP). Também atuou na Santa Casa de Umuarama.

Além da construção da Policlínica em Campo Mourão, doutor Garcia teve um papel importante na sociedade mourãoense. Adquiriu propriedades na região e foi reconhecido pela produção de soja e pecuária em duas fazendas-modelo mantidas em Peabiru e Palmital, respectivamente. Sua liderança nata entre os produtores de leite fez com que se tornasse membro-fundador da Cooperativa Agropecuária Mourãoense (Coamo), criada em 1970. Também foi vereador e investidor no agronegócio, mas optou em passar seus dias se dedicando à saúde.

Em 2002, conta a família, demonstrou o profissionalismo ao perceber que iria sofrer um enfarte enquanto operava um paciente. Primeiro salvou o paciente, depois foi cuidar de si. Manteve o trabalho no consultório até 2009. Era o momento de se aposentar. Veio morar em Curitiba para ficar perto dos filhos. Teve outro enfarte, em 12 de maio, e não resistiu. Deixa três filhos, Marcelo, Heloísa e João Carlos, o genro Donizetti Dimer, a nora Andreza, e a neta Ana Luisa.