Letícia Nogarolli, da Rádio Colméia e do CRN1, me enviou esse ótimo texto publicado no Observatório da Imprensa. Não é preciso começar a torcer por eles, mas é preciso dar um basta em algumas atitudes imediatamente!
Por Billy Culleton
Nos últimos anos é assustador o crescimento da discriminação contra os argentinos no Brasil. Ter birra de argentino está na moda. O anti-argentinismo extrapolou a rivalidade futebolística e passou para as relações pessoais.
Incentivado por narradores esportivos e insuflado por comerciais de TV, desprezar argentinos passou a ser um comportamento nacionalista. Pessoas que até pouco tempo atrás eram imparciais, agora torcem contra a Argentina em tudo: desde esportes até indicadores sociais. Essa multidão não sabia que era uma questão de patriotismo ser ‘inimigo’ dos argentinos. Ainda bem que a mídia os avisou.
A cada dia mais, uma parte da mídia insiste em cultivar a rivalidade, ridicularizando e apontando supostos estereótipos que em nada tem a ver com o argentino comum. Nas narrações esportivas são comuns os comentários desabonadores.
Na Internet, a proliferação de piadas de argentinos. Mas a grande novidade desta Copa são as propagandas na TV ridicularizando os argentinos. Recentemente, uma marca de cerveja foi obrigada a tirar do ar um comercial que agredia e ridicularizava os argentinos.
O problema é que essa postura contagia parte da população, que começa a ter atitudes discriminatórias contra os argentinos. Há poucos anos atrás, não existia esse pr econceito. Isso foi crescendo lentamente e agora está chegando ao limite do tolerável, refletindo nas relações interpessoais.
No início de junho, um professor universitário argentino, há 20 anos no Brasil, foi num Posto de Saúde de Porto Alegre. Tinha sofrido um pequeno arranhão no joelho após leve queda de moto. Percebendo o sotaque, o enfermeiro perguntou de onde ele era. "Argentino? Não acredito, num sábado de manhã e eu tenho que consertar um argentino!", se referindo ao doutor em Filosofia pela Universidade de Oxford e que hoje leciona numa conceituada universidade da capital gaúcha. Esse argentino, naturalizado brasileiro há anos, ficou na dúvida se contava ou não o lamentável episódio para sua esposa brasileira e seus dois garotos, também nascidos aqui.
Gestos de intolerância
Já existem relatos de filhos de argentinos que são constrangidos na escola por terem essa ‘triste’ ascendência. São vítimas de gozações e discriminação. O motivo? Fora a rivalidade futebolística, ninguém sabe muito bem qual é. Porém, todos têm a certeza de que ser argentino não é algo bom. Pelo menos, é isso que aparece constantemente na mídia. Assim, está se criando nas novas gerações um perigoso sentimento de xenofobia. E pior, em cima de um estereótipo desatualizado e preconceituoso.
Os cem mil argentinos que moram no Brasil, não conseguem entender isso. A grande maioria tem parceiros e filhos brasileiros, além de trabalhar, pagar impostos e ter escolhido este país por opção. Por outro lado, milhares de brasileiros moram na Argentina. São admirados e respeitados. Na Argentina existe quase uma idolatria pelo Brasil. Essa sensação também pode ser vivenciada por todos os brasileiros que visitam Buenos Aires.
Enquanto isso, do lado de cá a coisa é diferente. Com o pretexto da rivalidade futebolística se cultiva a intolerância e o preconceito. Parece incrível, mas enquanto os argentinos têm admiração pelos brasileiros, aqui a ordem é esculhambar os ditos ‘hermanos’. Importante lembrar que afirmar ‘odeio argentinos’ não é menos discriminatório que dizer ‘odeio negros’ ou ‘odeio judeus’.
No Brasil, as leis são muito rigorosas com qualquer tipo de discriminação: contra negros, índios, crianças, mulheres e raças. Porém, contra argentino tudo pode! Isso está liberado. Os comerciais podem simular argentinos se machucando ou sofrendo agressões que não tem problema. "Isso é brincadeira. Não é para levar a sério!", dizem alguns.
O perigo é que esses gestos de intolerância incentivam outros gestos parecidos. Inclusive os exageros, como os do enfermeiro em Porto Alegre.
Publicado no Observatório da Imprensa