Ademir da Guia |
Tenho muitos ídolos no futebol. Um deles é o Ademir da Guia que, com sua elegância e inteligência, comandava o Palmeiras nos anos 1970. Uma época que dava gosto ver o Palmeiras jogar. Eu sofria com eles, sou são paulino!, mas nunca deixei de admirar o Divino e seus companheiros, um melhor que outro. Até hoje não me conformo de ter visto o Da Guia na reserva da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1974 enquanto a equipe do retranqueiro e já teimoso Zagalo capengava nos campos alemães.
Em maio de 2006, no semanário Entre Rios, reproduzi o texto abaixo do Museu do Esporte, no qual o filho do Domingos da Guia conta a sua partida inesquecível, a vitória sobre o Corinthians na final do Paulistão de 1974.
Minha Partida Inesquecível, por Ademir da Guia
Ademir ao lado de Dudu comandou o Palmeiras na vitória sobre o grande rival Corinthians.
Dudu e Ademir da Guia |
O maior craque da história do Palmeiras vestiu a camisa alviverde por quase vinte anos. E nenhuma partida mexeu tanto com seus nervos quanto a decisão de 1974. Foi o dia em que o Divino comandou o Verdão para silenciar a nação corintiana.
E Ademir da Guia se lembra muito bem daquele dia.
“Na chegada ao estádio, tudo se repetia como em todos os meus outros finais de semana. Desci do ônibus, onde ocupei o esmo banco de sempre (o segundo do lado direito), passei pelo saguão e entrei no vestiário. O ritual, ali dentro, também seguiu o procedimento normal. Detalhes rigorosamente iguais aos de um jogo comum. O nervosismo que tomava conta dos jogadores, no entanto, denunciava: a partida era muito especial. O Corinthians não ganhava um titulo desde 1954. Por isso, entrou em campo como se partisse para uma guerra. Nós, palmeirenses, também estávamos muito motivados, por se tratar de um jogo contra o Corinthians. Não apenas pela rivalidade, mas principalmente porque, do outro lado, estava nosso adversário mais forte naquele ano. E jogar contra times de qualidade é sempre agradável. E enfrentar o Corinthians em uma decisão era muito especial. Pouco antes de entrar, nosso capitão Dudu ainda veio conversar comigo, como acontecia na maioria das partidas. Ele era uma espécie de técnico dentro do campo. Gritava e orientava cada um dos companheiros. Subimos os degraus que dão acesso ao gramado do Morumbi e, quando concluímos a caminhada, avistamos a multidão. Eram 120 mil torcedores, 70% dos quais torciam pelo Corinthians. Pior, todos estavam enlouquecidos para ver o alvinegro voltar e ser campeão. Não como negar que uma torcida favorável ajuda uma equipe de futebol. Mas o Palmeiras possuía uma imensa vantagem. Estava acostumada a participar de muitas decisões. Havíamos conquistado os títulos paulista e brasileiro de 1972 e o bicampeonato paulista em 1973. Tínhamos duas ausências: Eurico machucado e César suspenso. Nós éramos como a imprensa dizia – A Academia de Parque Antártica”.
E o tranqüilo Ademir da Guia começou a falar sobre o jogo propriamente dito.
“Sentíamos claramente que os jogadores do Corinthians estavam nervosos dentro do gramado. Mesmo assim, houve dificuldades durante a partida. Tentávamos cumprir as determinações básicas do técnico Osvaldo Brandão. O ponta esquerda Nei ficava em cima de Zé Maria impedindo que ele fosse ao ataque. Luis Pereira evitava avançar demasiadamente como costumava fazer. A partida estava muito igual. Não havia erros nem de um nem do outro. A marcação era rígida. Tentava me livrar abrindo espaços para os dois lados. Quando caia para a esquerda, lá estava o Tião no meu encalço. Quando voltava um pouco e vinha para a direita, quem se aproximava de mim era o Rivelino. Era um duelo difícil. Porém eles precisavam mais da vitória. Ninguém queria ser vice-campeão, principalmente nas condições em que o Corinthians se encontrava. Então, repentinamente, uma cobrança de faltas violenta do Rivelino acertou a cabeça do Dudu, na barreira. Ele caiu desmaiado e saiu de campo. Poucos minutos depois, estava de volta ao gramado. Se fosse um jogo comum, provavelmente não retornaria. Por isso, a visão do capitão á beira do campo pedindo para entrar mexeu com nossos brios. Ficamos ainda mais determinados em busca da vitória”.
Ademir da Guia e Rivelino: isso sim era futebol! |
E veio a parte que mais emocionou Ademir – “Então veio o gol. O cruzamento do Jair Gonçalves encontrou Leivinha, que subiu mais do que toda a defesa e cabeceou. A bola caiu exatamente no pé direito do Ronaldo. O chute saiu forte, indefensável, no canto esquerdo de Buttice, goleiro argentino do Corinthians. Na verdade, foi esse o diferencial daquele jogo. O gol. O Vaguinho, ponta direito alvinegro, costuma reclamar até hoje, alegando que a chance do empate foi desperdiçada nos momentos finais, em um chute dele próprio. Um fator que contribuiu para dar um gosto especial àquela vitória, é que houve muito equilíbrio. Costumam dizer que a festa palmeirense não teve muita emoção, devido à presença de milhares de corintianos, tristes e calados no Morumbi. Não é verdade. Os jogadores comemoraram demais. Uma emoção incalculável. Prova disso é que vários atletas foram ao Parque Antártica comemorar junto com a torcida mais um titulo para o Palmeiras. Eu preferi ficar em casa. À noite ainda assisti ao vídeo da partida. Tudo funcionava como se eu acabasse de participar de apenas mais uma, entre as muitas partidas da minha vida. A vitória contra o Corinthians, a faixa de campeão e tudo o que se passou dentro do campo, no entanto, garantiam que aquele tinha sido o melhor de todos os jogos”.
Dia 22 de dezembro de 1974 – Palmeiras 1 x Corinthians 0.
Gol de Ronaldo.
Local: Morumbi.
Publico: 120.522 torcedores.
Juiz: Wanderley Boschilia.
Palmeiras: Leão. Jair Gonçalves. Luis Pereira. Alfredo e Zeca. Dudu e Ademir da Guia. Edu. Leivinha. Ronaldo e Nei. Técnico: Oswaldo Brandão.
Corinthians: Buttice. Zé Maria. Brito. Ademir e Wladimir. Tião e Rivelino,
Vaguinho. Lance. Zé Roberto (Ivã) e Adãozinho. Técnico: Sylvio Pirilo.
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